segunda-feira, 29 de abril de 2013

Um desabafo de mãe




Adorei receber o convite dessa pessoa tão especial que é a Claudia, madrinha querida e agora comadre. Adoro esse universo de crianças, mães, educação e saúde e inicio minhas postagens com um texto que escrevi sobre autonomia e um pouquinho do que tenho visto em minhas andanças por ai!

Hoje evidencio pela minha experiência de atuação (15 anos) em escolas de educação infantil a importância da autonomia.

Um dos problemas mais relevantes que abordamos hoje com os pais em relação à educação e desenvolvimento infantil é a falta de autonomia. A cada ano sobem as queixas dos professores com relação a alunos com falta de atenção, inseguros, dependentes e com falta de confiança, fatores que podem influenciar no processo de aprendizagem. Sobem também os diagnósticos de transtornos de déficit de atenção e hiperatividade e por isso resolvi escrever este texto para reflexão.

Hoje a média de filhos é de 1 a 2 filhos por casal, o que difere bastante das numerosas famílias de antes. Costumo brincar que, se tivéssemos oito filhos, todos teriam autonomia, amarrariam os próprios sapatos, comeriam sozinhos e vestiriam suas próprias roupas. Atualmente, por termos menos filhos (e me incluo nisso), acabamos “fazendo” mais por eles. Alguns pais que trabalham bastante, talvez por culpa, quando estão em casa com os filhos sentem-se na obrigação de serví-los a todo momento, acarretando essa crescente falta de autonomia, pois quando as crianças recebem algo pronto (como um simples copo d’água), não mais precisam coordenar o que pensam, sentem (ex:sede) com a coordenação motora.

Em alguns berçários os bebês já não sabem mais descascar bananas, porque os pais já as dão descascadas e praticamente mastigadas (amassadas), assim, não fazem mais os movimentos de pinça (importantes para a posterior pega), nem os dentes trabalham (assim, a arcada não cresce, falta espaço para erupção posterior dos permanentes). E como naturalmente optamos pela lei do mínimo esforço, as crianças não mastigam mais (côco nem pensar, cenoura- só na sopa), a carne boa é a carne “molinha”, o filé mignon, e assim, aproximadamente 7 em cada 10 crianças tem problemas com a arcada dentária (que não mastiga - não cresce, já que é o estímulo muscular que estimula o crescimento ósseo). Arrumar a própria cama então é quase uma escravidão, evidencio então hoje cada vez mais crianças rápidas mentalmente (mexem com qualquer controle remoto ou desbloqueiam senhas com facilidade), mas onde o corpo não acompanha, porque os movimentos são sempre poupados.

As crianças de zero a 6 anos já tem uma tendência maior a ficar no “mental”, na fantasia e se não as trouxermos para o “corpo”, para as atividades no concreto, para o “pé no chão”, elas ficam cada vez mais no “mundo da lua”. Tem dificuldades com organização espacial, tropeçam e caem com facilidade, dependem de um adulto para realizar as atividades e tem menos confiança em sua capacidade. Sim, porque quando fazemos por elas, demonstramos no fundo uma falta de confiança na capacidade que elas têm de realizar as próprias atividades. E somando-se isso ao reduzido número de filhos por família, o aumento da violência e insegurança nas ruas, a culpa que hoje alguns pais sentem por trabalharem fora - pronto: televisão e computador neles, ah e tudo pronto, prato feito, comida na boca, MAM”ae veste a roupa rapidinho para não se atrasar, e amarrar os sapatos então, nem pensar! Estabelece-se então cada vez mais a lei do mínimo esforço, onde tudo já vem pronto e o mundo está aí, para servi-los sempre. Até mesmo os brinquedos hoje brincam sozinhos, as crianças são meros “espectadores”, assistem aos brinquedos que dançam, correm sozinhos, diferentemente quando tínhamos que “criar” os próprios brinquedos, transformando um espiga de milho em boneca e uma bola de meia virava um jogo de queimada. Está montado então o ciclo:Nossas crianças passam ainda mais tempo na fantasia e experimentando cada vez menos situações reais, que a tirem da zona de conforto. E todas vez que saem da zona de conforto, entramos na de poder, onde temos que desenvolver habilidades antes ainda não experimentadas, como mudar de classe, de amigos, de brincadeiras, coisas que antes aconteciam naturalmente nas ruas.

Perda de autonomia, medo de enfrentar situações diferenciadas daquelas do cotidiano (ainda que corriqueiras), dificuldade de relacionar-se com outras pessoas (principalmente estranhos, em situações cotidianas, como ir ao banco, comércio, serviços...), falta de iniciativa, reclusão, distanciamento da realidade, isolamento em mundos alternativos (como o virtual, em computadores e videogames)... É fato, por exemplo, que em países onde a alta tecnologia já se estabeleceu de forma quase onipresente, como o Japão, a existência de adolescentes que tem amigos no universo virtual e não conhecem e nem interagem com colegas de sala ou vizinhos. No Brasil, as crianças estão desaprendendo as brincadeiras de rua, tradicionais até algum tempo atrás, tendo dificuldades de estabelecer amizade com colegas que vivem na mesma rua e também se refugiando em computadores e games...

Apesar da fama liberal que ronda os brasileiros, o protecionismo fala mais alto quando o assunto é educar os filhos. Principalmente se, para aprender, as crianças tiverem que experimentar situações novas. Preocupados com a segurança e com medo de que as crianças possam machucar-se, os pais, por muitas vezes, acabam impedindo os pequenos de explorar algo novo ou passar pela frustração.

Esta foi a conclusão da pesquisa Tente Algo Novo, que ouviu 800 crianças de 8 a 13 anos de quatro países: Brasil, Argentina, França e Reino Unido. De acordo com o estudo, cerca de 82% dos entrevistados alegam que a preocupação de as crianças se machucarem é um impedimento na hora de deixá-las experimentar coisas novas, frente a 69% dos pais entrevistados na Argentina, França e Reino Unido.

De acordo com Jerome e Dorothy Singer, professores de psicologia da Universidade de Yale e coordenadores do estudo, é fundamental que as crianças vivenciem experiências novas que envolvam um certo risco, desde que com supervisão e regras claras. Segundo os especialistas, o fato contribui para libertar os pais para que, também, libertem os seus filhos dos medos excessivos e hábitos sedentários. “O estudo reforça a importância de dar às crianças a oportunidade de aprender pela experiência, mesmo que essa possa envolver um certo grau de risco aparente ou de exposição a comportamento inéditos. As crianças podem sentir-se mais felizes quando expostas a novas atividades, porque encontram novidade, excitação e a chance de tentar, por elas mesmas, algo diferente do que as experiências que lhes foram dadas em casa, prontas”, afirma Jerome"

E podemos sim, dividir tarefas com nossos filhos, permitindo-os que sintam-se seguros ao sentirem que confiamos na capacidade que tem de enfrentar o novo, inclusive nos libertando de tanta culpa e descomplicando, simplificando situações para evitar poupá-los demais de situações imoprtantes que irão prepará-los para a vida.

Apenas para refletir, e sim, se fizer sentido, Agir!!!

Erika Pignataro Massaro
Coodenadora Geral do Programa CrianSaúde


http://www.criansaude.com.br/

6 comentários:

  1. Nossa um belo texto!A cada linha um reconhecimento,estamos mesmo mimando muitos nossos filhos e tentando protegê-los demais.Acabamos privando-os de descobrirem as coisas sozinhos.Uma bela reflexão!!!Obrigada!!!!

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    1. Fernanda, vc vai adorar outros textos que estão por vir!!!! Continue conosco e mto obrigada por estar aqui tb.... bjos

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    2. Oi Fernanda, obrigada e eu também sou mãe, tenho que reler esse texto algumas vezes, porque com nossa rotina hoje, acabamos sem querer entrando no automático. E outras reflexões virão, aceito sugestões, abraço, Erika

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  2. Sim, Érica, você tem toda razão! Erramos tentando acertar, mas erramos. Nossos filhos estão cada vez mais dependentes e inseguros...e por que não dizer, folgados! Na tentativa de compensar nossa ausência ou pretendendo privá-los dos sofrimentos da vida, oferecer mais conforto do que tivemos, acabamos suprimindo uma etapa essencial do aprendizado: a prática! Nossos filhos não praticam viver a vida como ela deverá ser enfrentada na fase adulta. Claro que, por força das circunstâncias, por vezes somos obrigados a agir com um pouco mais de cautela. O mundo, hoje, já não é mais aquele quintal maravilhoso onde brincávamos de carrinho de rolimã pelas ruas. Algo mudou, mas nosso excesso de zelo, realmente, está confinando, cada vez mais, nossos filhos num mundo virtual.

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  3. Oi Kátia, fazemos o que podemos para o momento, mas essas reflexões nos apoiam a tomarmos consciência para agir de forma diferente. E esse mundo virtual acaba favorecendo nosso lado mais racional e afastando o lado humano, as crianças passam a nãio vivenciar o corpo, o agora. Estão sempre no passado ou no futuro, pensando, pensando, pensando, assim como nós. Um abraço, Erika

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  4. Acho que tudo isso resume tb: ao exemplo!!!! Precisamos nos policiar mais e viver mais o mundo real e quem sabe eles nos sigam!!!! beijos a todas....

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